Série com três episódios apresenta o caso emblemático sobre mortalidade materna no Brasil
Nesta segunda, 21 de março, Dia Internacional Contra a Discriminação Racial, foi lançado o primeiro episódio do podcast “Caso Alyne Pimentel: 20 anos”. A história de Alyne da Silva Pimentel Teixeira, uma mulher jovem, negra, moradora de Belford Roxo (RJ), vítima de negligência médica, será contada em uma série de três episódios, que serão disponibilizados semanalmente, em plataformas digitais, como o Spotify.
A morte de Alyne Pimentel completa 20 anos em novembro de 2022 e é um dos casos mais emblemáticos de mortalidade materna no país. Alyne, uma jovem de 28 anos, teve o direito à vida e à maternidade interrompidos: foi vítima fatal do racismo estrutural e da violação dos direitos reprodutivos das mulheres negras.
Mas 20 anos depois, o que há de tão diverso no caso dela? O que torna o caso de Alyne tão importante no que diz respeito à mortalidade materna?
O caso é emblemático porque revela uma série de falhas na assistência médica, que foi agravada pela situação de Alyne ser uma mulher negra, refletindo o racismo institucional e estrutural do país. E a situação nessas duas décadas não mudou muito no Brasil: a redução da morte materna continua sendo um desafio.
Ao longo dos três episódios, a história de Alyne é narrada e rememorada, abordando temas como justiça reprodutiva, violência obstétrica e mortalidade materna no Brasil.
O primeiro episódio narra a saga de Alyne Pimentel, grávida de seis meses, em busca de atendimento médico, até a sua morte em 16 de novembro de 2002, às 19 horas, 5 dias após sua primeira ida ao hospital com dores e náuseas.
A história é contada e discutida por especialistas em justiça reprodutiva e advogadas, entre elas, Beatriz Galli, relatora nacional de Direitos Humanos da Plataforma Dhesca Brasil; Emanuelle Goes, enfermeira e doutora em saúde pública e Sonia Corrêa, pesquisadora, ativista e co-coordenadora do Observatório de Sexualidade e Política (SPW).
O segundo episódio, a ser lançado em 28 de março, trata sobre o processo que denunciou o Estado brasileiro ao Comitê da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher, o Comitê CEDAW. Entre as entrevistadas estão Lúcia Xavier, ativista de Direitos Humanos das Mulheres Negras e coordenadora da ONG Criola, e Juliana Alvim, professora de direitos humanos da UFMG, que atua junto ao Centro de Direitos Reprodutivos.
O terceiro e último episódio da série, que vai ao ar em 4 de abril, tem como foco os avanços e retrocessos após a condenação do Estado brasileiro pelo Comitê Cedaw. Destaque para as entrevistas de Anielle Franco, diretora do Instituto Marielle Franco e de Sandra Valongueiro, médica e pesquisadora da Universidade Federal de Pernambuco.
O material traz um olhar sobre os corpos das mulheres negras e periféricas, violados em seu direito reprodutivo e na ausência de serviços de saúde materna de qualidade. Expõe, ainda, a obrigação do Estado brasileiro em assegurar recursos efetivos de saúde às mulheres durante a gravidez e o parto.
Recomendação internacional
O caso Alyne Pimentel foi o primeiro que teve como resultado a responsabilização do governo brasileiro por um órgão internacional de direitos humanos em vista de uma morte materna evitável, expondo a violação do Brasil aos direitos reprodutivos das mulheres.
Em 2011, o Comitê CEDAW emitiu sua decisão e declarou o Estado brasileiro responsável pela morte de Alyne e reconheceu dois fatos principais no caso: a morte de Alyne foi, sim, uma morte materna e que não havia sido garantido a ela “serviços adequados relativos à sua gravidez.”
Organização
O podcast Caso Alyne Pimentel: 20 anos é uma realização do Portal Catarinas, Coletivo Feminista Sexualidade e Saúde (CFSS) e Coletivo Margarida Alves (CMA), com o apoio do Cladem Brasil (Comitê Latino-americano e do Caribe para a Defesa dos Direitos da Mulher). A produção é parte de uma estratégia nacional por Justiça Reprodutiva formada por 15 organizações.
Essa articulação entre as quatro organizações gerou também a publicação de pareceres com o objetivo de dar subsídio jurídico à garantia dos direitos sexuais e reprodutivos. Integra essa parceria a cartilha “Direito internacional para feministas: como fazer valer nossos direitos no campo da justiça reprodutiva?”, que tem lançamento previsto para 6 de abril.
Entenda o caso
Aos 28 anos, grávida de seis meses, negra e da periferia de Belford Roxo (RJ), Alyne foi vítima do Estado brasileiro, que falhou em garantir serviços de saúde eficazes e de qualidade na gestação e no parto, resultando em um feto natimorto, e, após cinco dias de sua primeira entrada no hospital, na sua morte, em 16 de novembro de 2002.
Mortalidade materna no Brasil
Dados do Ministério da Saúde, apontam que em 2002, ano da morte de Alyne, a taxa de mortalidade materna no Brasil era de 68,9 óbitos maternos por 100 mil nascidos vivos. Em 2018, passou para 59,1 óbitos a cada 100 mil nascidos vivos.
Outro estudo, lançado pela Fundação Abrinq, em 2020, foi registrado o maior aumento no número de mortalidade materna dos últimos 10 anos. Foram 67,9 mortes a cada 100 mil nascidos vivos (em 2019 eram 55,3 mortes).
De acordo com o dossiê Mulheres Negras e Justiça Reprodutiva, realizado por Criola, no período da pandemia, até maio de 2021, foram registradas 1.176 mortes maternas, sendo que destas mulheres, 65,93% eram negras.
Ficha técnica
Esse podcast é uma realização do Portal Catarinas, Coletivo Feminista de Sexualidade e Saúde (CFSS), Coletivo Margarida Alves (CMA), com o apoio do Cladem Brasil (Comitê Latino-americano e do Caribe para a Defesa dos Direitos da Mulher). A produção é parte de uma estratégia nacional por justiça reprodutiva formada por 15 organizações.
Produção e coordenação: Paula Guimarães
Pesquisa: Letícia Vella
Transcrições: Cassilda Teixeira
Entrevistas: Viviane Nascimento
Roteiro e locução: Anna Carla Ferreira
Edição: Douglas Vieira da Criar Brasil
Poema: A noite não adormece nos olhos das mulheres, de Conceição Evaristo
Apoio: Rubia Abs da Cruz